segunda-feira, 13 de novembro de 2017


Sergisvaldo era assim desde menino. Com seu olhar, dominava a todos. Os pais, os amigos, os professores, adultos, velhos e crianças morriam de medo daquele olhar. Ele se acostumou com aquilo e obtinha tudo que queria com um simples olhar. Seu olhar era uma ordem e pronto. Nunca ninguém havia tentado descobrir o que aconteceria em caso contrário.
Sempre foi assim, até conhecer Marisnalva. Ela tinha o olhar ainda mais poderoso, pelo menos para ele. Ela também foi a primeira a contestar seu olhar e a sua primeira mulher de verdade também. Foi amor a primeira vista e foi a primeira vista que ele se entregou  aos seus comandos. Se casaram em pouco tempo.
Ele obedecia e tinha medo. Ela o surrava vez por outra com um terrível chicote e ele simplesmente não conseguia reagir àquele olhar. El,e que de mandão virou submisso, de lobo se viu transformado em cordeiro,  aguentou aquela situação apenas por algum tempo. Um ano e meio, para ser mais exato.
Um dia, quando ele quis de verdade realizar uma fantasia sexual e Marisnalva não o permitiu, apesar de suas insistência e apesar de ele nunca ter se recusado nada a ela, por mais estranho e humilhante que fosse. Não só recusou como acabou o surrando com o chicote e enchendo suas costas de lanhos sangrentos, e o amor se transformou em ódio, na mesma intensidade só que ao contrário.
Ele decidiu que só tinha um jeito. Era matar Marisnalva ou se condenar a submissão por todo o sempre. Ficou com a segunda opção, é claro.
Ele deixou um facão sob a almofada do sofá. Não havia perigo dela descobrir pois ele é quem arrumava a casa. Isto ela deixou claro desde o princípio. Mas, chegado o momento dele executar seu plano, aproveitar que ela estava distraída e golpeá-la pelas costas, ela se virou e o fuzilou com seu olhar mais indiscutível e ele recuou e desistiu como sempre.
Num primeiro momento, ele desistiu da ideia, mas depois descobriu por acaso que ela o estava traindo com outro homem e resolveu-se novamente a enfrentá-la. Mas, para isso, primeiro precisava treinar. Talvez, se se acostumasse a matar, enfrentasse a situação e se acostuma-se a ela, talvez não recuasse numa outra tentativa. Resolveu começar com alguma vítima ao mesmo tempo aleatória e indefesa.
Uma criança. Porém as crianças tem pais. Mesmo assim, é um bom começo, não tem força nem experiência para se defender.
Foi ao parque. Os brinquedos ficam ao lado de uma floresta. Um lugar muito estratégico. Observou o parque a procura de uma mãe distraída. Havia uma que deixava sua filha a vontade, enquanto lia. Durante uma hora, apenas uma vez foi verificar como estava a filha. Depois, continuou lendo. Ele atraiu a menina oferecendo um pirulito. Foi a chamando em direção a floresta. Lá chegando, viu a criança a sua disposição. O seu lindo pescocinho a disposição para ser esganado. Mas, que nada. Sergisvaldo ficou com pena. Pensou consigo - O que é que estou fazendo? Matar uma criança ? Que covardia. Deixou a criança ir.Foi seu primeiro fracasso.
Da segunda vez, resolveu atacar uma velhinha. Sim, uma velhinha seria uma boa. Indefesa, já viveu bastante e tem pouco por viver. Como treino seria legal.
Soraia, tinha oitenta e dois anos. Foi sua primeira vítima. A coitadinha mancava e não enxergava bem e, por isso, não pode oferecer muita resistência. Para começar foi bom. A velhinha gostava de passear com seus gatos à noite e fio fácil surpreendê-la numa viela escura e solitária, dessas que existem em quase todos arrabaldes pobres das cidades.
Da terceira vez foi mais ousado. Acompanhou um rapazinho por dias, estudou seus movimentos. Viu que ele era calado e solitário e, por isso, sofria bulying dos colegas. Não tinha amigos e gostava de buscar os caminhos mais longos e solitários tanto para ir para a escola como para voltar para casas. Era claro que o menino não se sentia feliz nem em casa nem na escola, ou seja, não era feliz em lugar algum. Começou a encontrar um sentido nas coisas que estava fazendo. Matar aquele rapaz seria livrá-lo de um peso. Sentiu orgulho e percebeu que começara a gostar do que estava fazendo, esquecendo por completo das muitas vezes que humilhara seus colegas na escola quando ainda era um menino. Desta vez, ao praticar seu ato atroz, não sentiu nojo. Teve até prazer no que fez. Em seu delírio chegou a ver gratidão nos olhos que na verdade expressavam pavor na hora da morte.
E aí foram muitas vezes, muitos assassinatos. Ele foi para as manchetes dos jornais - Assassino em série atava de novo. E foi ficando viciado em matar. E foi adiando seguidas vezes o assassinato que no inicio serviu de pretexto para ele se tornar o que era. Um psicopata cruel que sente prazer no sofrimento dos outros.
Porém não praticara todos aqueles assassinatos. Pois não é que um outro assassino lhe seguia os passos e imitava seus métodos. Boa parte dos assassinatos não fora ele que cometera, mas outro ou, quem sabe, outros assassinos que atuavam na região. Este outro era até mais cruel, pois sempre deixava sinais de ter torturado a vítima o que causava mais horror. 
Finalmente, já se sentia seguro para concluir seu plano, ou seja, assassinar a mulher. Ele já se sentia forte o suficiente para enfrentar aqueles olhos dominadores.
Entrou decidido foi procurar debaixo da almofada do sofá onde havia  escondido o facão com que pretendia golpear a sua última vítima. Sim, última. Decidira abandonar aquela vida de crimes após atingir sua meta final. Sabia que era errado continuar aquilo. O outro assassino acabaria recebendo a fama pelos seus crimes, mas ele não se importava com a repercussão. 
Mas, surpresa! O facão não estava lá. Alguém o tinha retirado, tinha certeza. Quando começou a se ligar de quem poderia ter sido, já foi tarde demais. Recebeu o primeiro golpe pelas costas e caiu no chão, prostrado e inerme. Logo em seguida, escutou a voz de sua esposa. 
- Você achou mesmo que poderia ter feito tudo isso sem que eu descobrisse? Não só descobri como fiz o mesmo. Eu sabia que você ia querer me matar, que era para isso que você estava treinando para pegar coragem. HAHAHAHA. Que ridículo que você é. Quando você vai, eu já estou voltando, será que ainda não entendeu isso?
Golpeou várias vezes até vê-lo bem morto, afogado em uma poça de sangue. 
Ao terminar, ouviu as sirenes dos carros de polícia ao redor da casa. Saiu de braços levantados e gritou. 
- O assassino era o meu marido, descobri ontem e tenho provas disto. Ele ia me matar. Deixou isto escrito em seu diário. Eu o matei em legítima defesa. Ele está aqui no chão da cozinha mortinho da Silva. 
Será que Marisnalva ia conseguir explicar a razão de tantas facadas. Só o ódio as poderiam explicar.

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